O chefe que manda desarmar o crime para não morrer

Documentos da investigação revelam que até comparsas eram proibidos de portar armas na casa de Doca, o chefe do Comando Vermelho que escapou da megaoperação


Enquanto o Estado contabiliza os 121 mortos da operação mais letal da história do Rio, o alvo principal, Edgar Alves de Andrade, o Doca, segue foragido. A megaoperação que transformou o Alemão e a Penha em zona de guerra na terça-feira (28) falhou em capturar aquele que é apontado como um dos principais chefes do Comando Vermelho (CV).

Agora, documentos que embasaram a própria operação revelam o porquê: Doca vive sob um regime de segurança tão rígido que beira a paranoia, protegido não apenas do Estado, mas de seus próprios aliados.

A investigação da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE), que fundamentou a denúncia do Ministério Público (MPRJ), expõe as regras internas da facção. A principal delas é uma ordem expressa: é proibida a entrada de homens armados na casa onde Doca se esconde. Nem mesmo os traficantes de seu círculo íntimo podem portar armas na presença do chefe.

A medida drástica, segundo os investigadores, existe por um único motivo: impedir que Doca seja preso ou, mais provavelmente, traído e morto por um fogo amigo ou infiltrado.

Uma estrutura corporativa para blindar o chefe

Os documentos e as mensagens interceptadas, aos quais o g1 teve acesso, mostram que o acesso a Doca é mais restrito que o de muitas autoridades públicas. Apenas um grupo seleto e de extrema confiança pode se aproximar. Ao seu lado na hierarquia, dividindo o comando do tráfico na região, estaria Pedro Paulo Guedes, o Pedro Bala, que também segue foragido.

Abaixo deles, a estrutura se assemelha a uma corporação, com gerentes e administradores dedicados a manter a operação funcionando e o chefe, seguro.

O homem-chave nessa engrenagem é Carlos da Costa Neves, o Gardenal. Apontado como o gerente-geral do tráfico no Complexo da Penha, ele não cuida apenas da logística da venda de drogas ou da expansão violenta da facção para a Grande Jacarepaguá. Gardenal é, na prática, o chefe da casa militar de Doca.

É ele o responsável por definir a escala de criminosos que fazem a segurança do esconderijo e por controlar rigorosamente quem entra e quem sai do imóvel. Foi em mensagens trocadas por Gardenal que os investigadores confirmaram a regra de ouro: “ninguém deve entrar armado na casa do chefe”.

O “síndico” que administra o crime

Se Gardenal cuida da blindagem física, outro nome gerencia a rotina administrativa da facção. Washington Cesar Braga da Silva, conhecido como Grandão ou Síndico da Penha, é descrito na investigação como o “gestor operacional” do CV na região.

Ele atua como um administrador, filtrando os problemas da “base” e levando as demandas até Doca. É o “Síndico” quem repassa as normas de conduta aos subordinados e organiza a folha de pagamento dos criminosos.

Tanto Doca quanto seus gerentes, Gardenal e Síndico, são considerados de “alta periculosidade” e tiveram a prisão preventiva decretada, mas nenhum foi pego na operação de terça-feira.

O fracasso em capturar a cúpula da facção, apesar do custo humano de 121 vidas, obriga o Estado a mudar de estratégia. A política de confronto deu lugar à política de recompensa. O Disque Denúncia agora oferece R$ 100 mil por informações que levem à captura de Doca.

O valor é recorde e simbólico. É a mesma quantia oferecida em 2000 por Fernandinho Beira-Mar. Vinte e cinco anos depois, a história se repete de forma trágica: a “guerra” ceifa a vida de dezenas nas favelas, enquanto o Estado precisa oferecer uma fortuna para tentar encontrar o verdadeiro chefe, que, protegido em seu bunker desarmado, assiste a tudo de longe.

Disque denúncia

Cartazes do Disque Denúncia de Doca e Beira-Mar / Foto: Reprodução

Central de atendimento: (21)2253-1177 ou 0300-253-1177
WhatsApp Anonimizado: (21)2253-1177 (técnica de processamento de dados que remove ou modifica informações que possam identificar uma pessoa)
Aplicativo: Disque Denúncia RJ

Com informações de g1*

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