Na Baixada Fluminense, milícia responde por desaparecimentos forçados seguidos por torturas, mutilações e mortes
Região concentra 25% dos desaparecimentos e 20% do número de corpos encontrados em todo o estado do Rio
A Baixada Fluminense tem 27.985 pessoas desaparecidas entre os anos de 2003 e 2023, o que corresponde a 25% de todos os desaparecimentos no estado do Rio de Janeiro. Os dados do Instituto de Segurança Pública (ISP) foram compilados e analisados pela organização Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial (IDMJR).
Segundo o boletim, lançado na última quarta-feira (30), Dia Internacional das Vítimas dos Desaparecimentos Forçados, além de 1/4 dos desaparecimentos em todo o estado estarem localizados na Baixada, a região também registrou aumento de áreas de desovas, indo de 77 áreas em 2022 para 92 áreas de cemitérios clandestinos em 2023.
Linhas férreas, terrenos baldios, margens de rodovias e lixões são os principais locais de desovas de corpos. Belford Roxo e Nova Iguaçu são os municípios com maior concentração de cemitérios clandestinos
“Os casos que deveriam ser tipificados como desaparecimento forçados são alocados de forma decadente e leviana na categoria de pessoas desaparecidas. Apesar do Brasil ter assinado em 1994, a Convenção Interamericana Sobre Desaparecimentos Forçados de Pessoas, a prática persiste no país, especialmente contra os mais pobres e negros”, afirma a IDMJR, no boletim.
Ainda segundo a organização, a consolidação do poder das milícias na Baixada e em todo o estado do Rio provocou o aumento das subnotificações e a diminuição dos registros oficiais de encontro de cadáveres. O boletim informa que foram encontrados 2.117 cadáveres e que o número representa aproximadamente 20% de todo o estado: 155 na Baixada e 704 no estado do Rio.
“Ao receber informações e denúncias de moradoras e moradores da região, identificamos que as milícias ao disputarem o domínio de territórios utilizam os desaparecimentos forçados como um instrumento de demonstração de poder, deixando cada vez menos evidências dos assassinatos, como forma de terror, impedindo que ocorram denúncias e busca pelos corpos”, analisa a IDMJR.
Pedagogia do medo
O boletim informa que o uso do esquartejamento tem sido utilizado como parte da estratégia e/ou método da atuação territorial das milícias, dos agentes e ex–agentes de segurança pública, bem como de varejistas de drogas. Os processos de mutilação de corpos ocorrem posteriormente aos desaparecimentos. Sequestro, tortura, assassinato, desmembramento até ocultação do corpo estão entre as violações.
“Estamos aqui tratando do método de produção do Terror do Estado. As milícias na Baixada Fluminense têm amplamente utilizado a decapitação e posteriormente a exposição de diversas partes de corpos desmembrados em espaços públicos (como linhas férreas e outras) para a construção de uma pedagogia do medo. Assim, elas imprimem a mensagem de controle e poder territorial, tudo isso ocorre em áreas predominantemente negras, faveladas e periféricas, que contam com ação ou a omissão do Estado”, diz o documento.