Operação revela o peso do abandono urbano fluminense
A remoção de 92 toneladas de obstáculos reacende discussões sobre segurança, abandono histórico e o direito básico de ir e vir nas periferias do Rio
A segunda-feira (24) começou com máquinas, blindados, policiais e curiosos nas ruas de diferentes cidades fluminenses. Era o pontapé inicial da Operação Barricada Zero, lançada pelo governo do Rio de Janeiro para retirar barreiras instaladas por grupos criminosos e que, há anos, dificultam a circulação de moradores e trabalhadores em territórios populares.
Segundo o Palácio Guanabara, apenas no primeiro dia de ação, 92 toneladas de entulho, estruturas metálicas, pedaços de concreto e outros obstáculos foram removidos. A ação mobilizou forças de segurança em cinco municípios: Mangueirinha, em Duque de Caxias; Grão-Pará, em Nova Iguaçu; São Simão e Dom Bosco, em Queimados; Cidade de Deus, na capital; e Jardim Catarina, em São Gonçalo. Na Cidade de Deus, quatro pessoas foram presas.
Governo promete endurecer contra novas barricadas
A remoção faz parte de uma política recém-anunciada pelo governador Cláudio Castro (PL), que afirma querer garantir o direito de ir e vir em regiões frequentemente dominadas por facções armadas.
“Essa ação integrada traz um recado muito claro para os que insistem em interromper o direito de ir e vir dos moradores: nós não vamos mais tolerar que barricadas sejam instaladas no Rio de Janeiro. E para os que ousarem reinstalar esses obstáculos, a resposta será dada à altura, com operações das unidades especiais das polícias Civil e Militar”, afirmou Castro.
Apesar do discurso firme, especialistas em segurança defendem que remoção física não basta — é preciso investimento social, presença permanente do Estado e políticas públicas que ultrapassem o ciclo de operações pontuais. Nas comunidades, muitos moradores comemoram a liberação das vias, mas permanecem temerosos com possíveis confrontos ou represálias.
Municípios serão acompanhados em etapas
O plano começou a ser estruturado há uma semana e deve se expandir ao longo dos próximos meses. O Instituto de Segurança Pública (ISP-RJ) identificou 13.604 barreiras somente na Região Metropolitana, um número que revela a dimensão do abandono histórico dessas áreas.
A primeira fase da operação contempla 12 municípios: Belford Roxo, Duque de Caxias, Itaboraí, Japeri, Maricá, Mesquita, Nilópolis, Nova Iguaçu, Queimados, Rio de Janeiro, São Gonçalo e São João de Meriti.
“Nossa ideia é as prefeituras fazerem o monitoramento, e a retirada será planejada para darmos segurança para a população e para quem está ali trabalhando”, destacou Castro. O governador também anunciou a criação de um sistema de gratificação para batalhões que retirarem e impedirem a reinstalação das barreiras.
Mapeamento detalha quase 14 mil obstáculos
O levantamento das barricadas usa o Sistema de Identificação Georreferenciada do ISP, abastecido com diferentes fontes: denúncias telefônicas, imagens aéreas de drones e helicópteros, registros policiais e ocorrências operacionais.
Os bloqueios variam — há desde lixeiras e restos de obras usados como barreiras improvisadas até estruturas complexas, descritas como “verdadeiras obras de engenharia”, erguidas por quadrilhas para controlar rotas e esconder armamentos.
Para dar conta das remoções, o estado comprou 50 “kits-demolição”, compostos por rompedores hidráulicos, retroescavadeiras e caminhões-basculantes, equipamentos que antes eram raros nas operações de segurança.
Denúncias podem ser feitas anonimamente
Para acelerar o processo, o Disque Denúncia criou um canal específico para informações sobre ruas fechadas por criminosos. Moradores podem ligar para (21) 2253-1177 ou 0300-253-1177, enviar mensagens via WhatsApp para (21) 2253-1177 ou usar o aplicativo Disque Denúncia RJ. O anonimato é garantido.
Comunidades aguardam efeitos reais
A operação reacende uma discussão antiga: retirar barricadas é importante, mas não substitui políticas públicas permanentes. Nas áreas afetadas, moradores querem segurança, mas também saneamento, mobilidade, escolas, lazer e emprego — direitos historicamente negligenciados pelo poder público.
Enquanto máquinas seguem retirando toneladas de concreto, o desafio maior continua o mesmo: garantir que essas ruas, agora abertas, também se tornem caminhos para cidadania, cuidado e presença do Estado — e não apenas palco de novas operações.
