Lewandowski: Não recebi nenhum pedido do governador do Rio

Em meio ao caos da operação mais letal da história, eclode guerra de narrativas entre Palácio Guanabara e Brasília; Lewandowski classifica ação como “cruenta” e nega ter recebido qualquer pedido de ajuda para a operação específica


O cheiro de pólvora mal havia se dissipado no Alemão e na Penha, e a contagem de corpos ainda subia, quando a guerra política eclodiu. Enquanto o Rio de Janeiro vivia seu dia de caos absoluto, com 64 mortos confirmados na operação mais letal da história do estado, o governador Cláudio Castro (PL) e o Ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, iniciavam uma troca pública de acusações, expondo o abismo da segurança pública no país.

Em Brasília, numa declaração que caiu como uma bomba no Palácio Guanabara, Lewandowski foi taxativo ao se desvencilhar do massacre em curso: “Não recebi nenhum pedido do governador do Rio de Janeiro para essa operação”.

A fala do ministro desmonta a narrativa que começava a ser construída por Castro. Lewandowski fez questão de jogar a responsabilidade constitucional de volta para o colo do governador, afirmando que a segurança pública “é exclusivamente dos governadores”.

Enquanto a política de “contenção” do governo do Rio se traduzia em dezenas de corpos, o ministro de Lula (PT) classificou a operação como “bastante cruenta”.

Num raro momento de humanidade vindo do poder central, Lewandowski diferenciou as vítimas da guerra: “Lamentavelmente, morreram agentes de segurança e, pior ainda, pessoas comuns, inocentes. É de se lamentar isso”, disse.

O ministro contrapôs a carnificina a um modelo supostamente baseado em dados: “Eu queria enfatizar que o combate à criminalidade se faz com planejamento, inteligência e coordenação”. E, numa estocada direta em Castro, ponderou: “Não posso julgar porque não estou sentado na cadeira do governador, mas quero apresentar a minha solidariedade à família dos policiais mortos e a solidariedade à família dos inocentes”.

Castro ataca o STF e chama ADPF de “maldita”

No Rio, enquanto a cidade parava refém de barricadas e tiroteios, o governador Cláudio Castro usava a entrevista coletiva não para consolar as famílias, mas para atacar seus adversários políticos. Castro afirmou que teve “negados três pedidos” para que as Forças Armadas ajudassem em operações, numa clara crítica ao governo federal pela não concessão da GLO (Garantia da Lei e da Ordem).

Lewandowski, por sua vez, explicou que a GLO “tem regras bastante rígidas”. Para ativá-la, o governador precisaria “reconhecer a falência dos órgãos nacionais [estaduais, na verdade] e transferir as operações de segurança para as Forças Armadas”. Castro, ao que parece, quer o poder de fogo dos militares sem ter que assinar o atestado de falência da sua própria política de segurança.

Mas o alvo principal da fúria do governador foi o Supremo Tribunal Federal (STF). Castro não mediu palavras e chamou de “maldita” a ADPF 365.

Vale lembrar: a ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) foi a decisão do Supremo, provocada pelo PSB, que impôs restrições a operações policiais em favelas durante a pandemia, liberando-as apenas em casos excepcionais. Na visão do governador e de seu núcleo de segurança, foi essa decisão que permitiu que “lideranças do tráfico de outros estados” viessem para o Rio.

Na prática, o governador lamenta publicamente uma decisão que foi criada justamente para tentar evitar massacres como o que ele próprio autorizou nesta terça-feira.

A guerra de siglas

Enquanto o Rio conta seus mortos, Brasília debate o futuro em siglas. Lewandowski afirmou que, além da “PEC da Segurança”, que visa criar “coordenação” e “inteligência”, está na Casa Civil o “projeto de lei Antifacção”. A proposta federal, segundo o ministro, foca na “descapitalização dessas organizações”.

É a velha dicotomia: Brasília fala em asfixiar o dinheiro; o Rio responde cortando vidas. No meio disso, 64 pessoas estão mortas, e o trabalhador segue refém do caos.

Com informações da Folha*

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