CPI DA ALERJ: ESPECIALISTA EM PSICOLOGIA COGNITIVA QUESTIONA RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO SHOW-UP
A CPI presidida pela deputada Renata Souza (PSOL) trata do Reconhecimento Fotográfico nas Delegacias
Em reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Reconhecimento Fotográfico nas Delegacias, da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), realizada nesta quinta-feira (17/08), a doutora em Psicologia Cognitiva pela Universidade do Arizona, nos Estados Unidos, Lilian Milnitsky Stein, criticou o modelo show-up de identificação facial, no qual é apresentado à vítima o rosto de apenas um suspeito. A pesquisadora apresentou uma série de propostas para aprimorar o processo de reconhecimento a fim de evitar prisões de inocentes ocasionadas por equívocos.
De acordo com Lilian Stein, o reconhecimento fotográfico pode ser utilizado, desde que seja respeitada a Resolução 484/2022, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que estabelece diretrizes para que o procedimento ocorra de maneira justa. “O reconhecimento fotográfico pode ser um problema mas também, uma solução. A questão não é se a identificação será fotográfica ou presencial, mas sim a forma com a qual é apresentada, como nos casos do show-up, dos álbuns de suspeitos e dos alinhamentos injustos. Tanto faz ser presencial ou por foto, desde que sejam obedecidas as recomendações dessa Resolução”, explicou.
A especialista, que também é pesquisadora em psicologia do testemunho, pela universidade PUC, do Rio Grande do Sul, citou como exemplo o caso do dentista André Biazucci Cardoso, reconhecido de forma equivocada por nove mulheres em decorrência de um suposto estupro. Após ele ficar preso por sete meses, exames de DNA comprovaram sua inocência. “A partir da lembrança de uma dessas vítimas, sobre a placa do carro dele, a Polícia chegou ao André. Ele foi reconhecido por várias dessas vítimas porque sua imagem foi exposta na televisão. Foi um falso reconhecimento porque o DNA do estuprador não batia com o do André”, destacou.
Ainda segundo Lilian Stein, é preciso ter cuidado com a produção de falsas memórias, fruto de um processo de esquecimento natural do ser humano. “A memória não é uma máquina fotográfica. Há uma degradação natural dessa lembrança, mesmo para o rosto de um criminoso. Dias ou semanas após o acontecido já são suficientes para diminuir a nitidez e a precisão do registro de memória, além de outras interferências como conversar com pessoas e ver fotos”, alertou.
Ao comentar sobre aspectos da Psicologia do Testemunho, Stein destacou outros fatores que dificultam o reconhecimento: o suspeito se tratar de uma pessoa desconhecida e quando este pertence a outro grupo étnico. A psicóloga explicou que o cérebro humano tem dificuldade de fazer o reconhecimento em casos assim. “É difícil reconhecer uma pessoa que se viu uma vez só. Mais difícil ainda é quando se trata de uma pessoa de outro grupo étnico”, acrescentou.
Como soluções para haver um reconhecimento fotográfico mais justo, Lilian Stein recomendou que haja uma ação conjunta entre as forças de segurança, Poder Judiciário e o Ministério Público Estadual; investimentos na capacitação dos policiais que coordenam o procedimento; o reconhecimento, fotográfico ou presencial, seja feito apenas uma vez, para evitar a contaminação da memória da vítima; além do cumprimento das diretrizes recomendadas pela Resolução 484/2022 do CNJ.
Reconhecimento para deficientes
O deputado Julio Rocha (Agir) perguntou à pesquisadora como é feito o reconhecimento de suspeitos quando as vítimas são deficientes auditivas, de fala ou visuais. Lilian Stein explicou que, nos dois primeiros casos, é necessário que o profissional responsável utilize a Língua Brasileira de Sinais (Libras). Já em relação aos deficientes visuais, a especialista pontuou que está em desenvolvimento um sistema de reconhecimento olfativo, no qual a vítima poderia reconhecer o local onde aconteceu o crime ou o autor através do odor.
Visita à delegacia
O colegiado fará uma visita à 54ª DP (Belford Roxo) para analisar como é feito o reconhecimento fotográfico na distrital. Segundo a presidente da CPI, deputada Renata Souza (PSol), houve casos de prisões de inocentes provocadas por equívoco no procedimento. “Ocorreram alguns casos nessa delegacia, um deles é do Paulo Alberto da Silva, porteiro que responde a 62 processos criminais por erro no reconhecimento fotográfico. É importante a gente ter uma perspectiva de como esse procedimento se dá dentro da própria delegacia”, afirmou.
Também estiveram presentes o vice-presidente do colegiado, deputado Munir Neto (PSD); o relator da CPI, deputado Márcio Gualberto (PL); as deputadas Dani Balbi (PC do B) e Verônica Lima (PT); e o diretor de ensino da Academia Estadual de Polícia Sylvio Terra (Acadepol), delegado Carlos Eduardo Rangel.